Petróleo, gás fóssil e carvão estão devastando o Pantanal

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Petróleo, gás fóssil e carvão estão devastando o Pantanal

Incêndios que estão destruindo o bioma se tornaram 40% mais intensos devido às mudanças climáticas, que têm como principal causa a queima de combustíveis fósseis

A maior planície alagável do planeta arde em chamas. Os incêndios que vêm devastando o Pantanal desde junho tiveram certo alívio nas primeiras semanas do mês passado, mas voltaram com força total no fim de julho e continuam batendo recordes sucessivos. Até agora, já são mais de 1,3 milhão de hectares queimados – área equivalente a 8 cidades de São Paulo ou 2 vezes o Distrito Federal. Quase 10% do bioma já virou cinzas. E deve piorar, já que o pico da temporada do fogo costuma ocorrer em agosto e setembro. 

Acidentais e, muitas vezes, criminosas, as queimadas vêm sendo intensificadas por uma estiagem que chegou antes do habitual e com temperaturas acima da média. Anormalidades que têm uma origem conhecida e cientificamente comprovada: as mudanças climáticas causadas principalmente pela queima de combustíveis fósseis. 

A relação clara de causa e efeito foi constatada pelo 1º estudo de atribuição sobre a tragédia que consome o Pantanal feito World Weather Attribution (WWA), uma rede internacional de cientistas de clima. Os pesquisadores observaram que as mudanças climáticas tornaram as condições que alimentam o fogo – calor, seca e vento – 40% mais intensas e de 4 a 5 vezes mais prováveis no Pantanal ocidental. 

Antes da crise climática, as condições meteorológicas para incêndios observadas em junho no Pantanal eram extremamente raras: cerca de uma vez a cada 160 anos. Agora, com a temperatura média do planeta já 1,2ºC acima dos níveis pré-industriais [e subindo], são quase 5 vezes mais prováveis – podem ocorrer cerca de uma vez a cada 35 anos. Se a temperatura subir 2°C, a possibilidade de ocorrer uma catástrofe como a atual pode ser acelerada em quase 10 vezes. Condições semelhantes às de junho se tornarão 17% mais intensas e ocorrerão em média cerca de uma vez a cada 18 anos. 

É o fim dos tempos? Não. Esse prognóstico pode ser revertido. Mas, para isso, os pesquisadores do WWA reforçam aquilo que cientistas de todo o mundo vêm falando há cerca de 50 anos: é preciso parar de queimar petróleo, gás fóssil e carvão. Os combustíveis fósseis precisam urgentemente ser banidos e substituídos por fontes renováveis de energia, como a eólica e a solar. 

Essa substituição tem de ser global porque os gases de efeito estufa produzidos pela queima de combustíveis fósseis não ficam “presos” no local de sua produção ou uso. Eles circulam por toda a atmosfera. Não adianta o país “A” eliminar petróleo, gás fóssil e carvão, se o país “B” não fizer o mesmo. Entenderam, Petrobras e ministérios de Minas e Energia e da Casa Civil?

Um exemplo prático disso vem do próprio Pantanal. Os estados do Mato Grosso e do Mato Grosso do Sul, onde está o bioma, não produzem uma só gota de petróleo ou uma só molécula de gás fóssil. E o maior consumo de combustíveis fósseis no Brasil ocorre no Sudeste e no Sul. Outro é o Brasil como um todo: a principal fonte das emissões brasileiras de gases de efeito estufa é o combo desmatamento-queimadas-agropecuária. Porém em nível global, a queima de combustíveis fósseis responde por dois terços dos gases que estão mudando o clima – inclusive no Brasil.

Assim, como tudo o que envolve a indústria do petróleo e gás fóssil, o que se vê com os incêndios no Pantanal é que os ganhos obtidos pelas petroleiras são concentrados,  localizados e privados, mas os prejuízos são imensos e distribuídos para todos. O histórico desse setor, em quase todos os países do mundo, é de riqueza para poucos e pobreza e devastação para todos, mesmo para quem não mora em cima nem perto das reservas de combustíveis fósseis.

É óbvio que é preciso zerar o desmatamento, seja ele no Pantanal, na Amazônia, no Cerrado, na Mata Atlântica, na Caatinga, no Pampa. É óbvio que é preciso investigar a origem dos incêndios no território pantaneiro e punir seus causadores, já que o bioma também sofre uma imensa pressão do agronegócio e parte do fogo ocorre em áreas com Cadastro Ambiental Rural (CAR). Mas não se pode ignorar a responsabilidade dos verdadeiros criminosos do que vem ocorrendo naquela planície: a indústria global de combustíveis fósseis – seus gestores, acionistas, investidores e também os políticos que continuam insistindo na exploração de petróleo como fonte de “riqueza e desenvolvimento”. 

Em maio, vimos o Rio Grande do Sul debaixo d’água por causa de tempestades anormais que foram exacerbadas pela crise climática. No ano passado, a Amazônia viveu sua pior seca também por causa das mudanças climáticas, e está sob sério risco de sofrer com uma estiagem ainda mais severa neste ano. O Pantanal queima devido às mudanças climáticas – relação devidamente comprovada pela ciência.

Enquanto isso, a Petrobras e alas do governo insistem em explorar petróleo na foz do Amazonas. A estatal anunciou ainda que descobriu gás fóssil em uma área que explora na Colômbia. E recentemente sua diretora de Exploração e Produção, Sylvia Anjos, propôs usar recursos do petróleo que a petroleira quer explorar na foz do Amazonas para combater o desmatamento no país. 

É uma conta que não fecha: mesmo que todo o desmatamento fosse interrompido agora, a continuidade da queima dos combustíveis fósseis destruiria também a Amazônia e as demais florestas do país. Uma coisa não substitui a outra.  

As pessoas e a biodiversidade afetadas pelos eventos extremos causados pela queima de combustíveis fósseis não podem mais esperar pela benevolência de executivos que se preocupam apenas com seus bônus anuais. Interromper a sanha fóssil é uma questão de sobrevivência – para humanos e outras formas de vida do planeta.

Por Alexandre Gaspari, Jornalista no ClimaInfo.

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ClimaInfo, 9 de agosto de 2024.

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